«vinho de arroz...»

foto
W. EUGENE SMITH, Tomoko no banho, Minamata, Japão, 1972.
Quando a empresa Chisso
se instalou numa fábrica no pequeno porto de Minamata, no sul do
Japão, os pequenos pescadores da região começaram a aperceber-se de
«um mal estranho» que causava tétano nos gatos. Pouco
depois, milhares de recém-nascidos apresentavam mal-formações dos
membros e graves lesões neurológicas.
Em 1956 descobriu-se que o culpado era o mercúrio: lançado para a
baía sem tratamento, depositara-se nos tecidos dos peixes e
crustáceos, contaminando toda a cadeia alimentar.
Eugene Smith era então um fotógrafo correspondente de guerra da
revista «Life»: temerário, estivera no conflito de Iwo Jima
e sofrera graves ferimentos numa mão, em Maio de 1945, numa explosão
de um obus. Foram necessárias 33 operações para recuperar as suas
capacidades: «Quando quis experimentar tirar uma fotografia, até
me foi difícil pôr o filme na máquina», contou mais tarde.
Em 1970, já fotógrafo da Magnum, quando finalmente se apercebeu do
primeiro grande «genocídio industrial» do pós-guerra, ele e
a mulher, Aileen, instalaram-se em Minamata, bem perto da casa onde
vivia a pequena Tomoko Uemura: «Todos os dias víamos passar a
mãe com ela às costas», contou Aileen Smith. A ideia era
registar a resistência da população local na guerra jurídica com os
administradores da Chisso: ficariam até que a empresa responsável
pelo «mal de Minamata» fosse obrigada a pagar indemnizações
com juros aos mais de catorze mil habitantes que haviam sido
afectados.
No dia 7 de Janeiro de 1972, quando Eugene e Aileen Smith
registavam uma manifestação junto de uma fábrica da Chisso, uma
dezena de seguranças da empresa atirou com o fotógrafo de cabeça
contra uma parede, provocando-lhe lesões irrecuperáveis: a sua mão
direita nunca mais deixou de tremer e o seu «olho bom» perdeu
sensibilidade. Nada que o impedisse de fazer uma sessão, em
lágrimas, com Tomoko e a sua mãe.
«Tomoko no banho» foi considerada uma das 100
fotos do século, e Eugene Smith (1918-1978) um fotógrafo memorável.
Isto só foi possível porque, nas palavras da sua mulher, «ao
contrário dos outros que vieram fazer umas fotografias, ele estava
nas reuniões com os doentes, bebia vinho de arroz com eles...»
Aileen Smith, uma americana de ascendência nipónica, depois da
morte do marido adoptou o Japão para viver, mas as suas relações com
a mãe de Tomoko deterioraram-se para sempre: a foto não conseguiu
impedir a jovem de morrer...

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