os dois
meninos de O'Donnell

'John
John salute' e o menino de Nagasaki
fotos
JOE O'DONNELL
Em Dezembro de 1945 o exército americano estava
estacionado em território japonês, depois da rendição de Hirohito e
das tristemente célebres tragédias atómicas. Fazia parte do corpo de
fuzileiros navais norte-americanos um jovem de 23 anos, de seu nome
Joe O’Donnell, que havia já servido o seu país na guerra na Coreia.
Não obstante, o seu «serviço» não era o de um vulgar fuzileiro:
segundo dizem, O’Donnell não tinha a mais pequena predisposição para
matar japoneses e felizmente não lhe deram uma arma como outra
qualquer… deram-lhe uma máquina fotográfica.
Distanciado, assim, dos deveres de uma
guerra convencional, o marine O’Donnell não teve grandes hipóteses
de morrer em campo de batalha, mas o seu trabalho de documentar a
devastação provocada pelas bombas provocou-lhe um tormento físico e
psicológico de que jamais conseguiu separar-se. Durante toda a sua
vida foi perseguido por sucessivas doenças provocadas pelas
radiações a que ficou exposto no Japão, mas ele próprio admitiu que
esse sofrimento era o menos comparado com a dor dos familiares das
vítimas de Hiroshima e Nagasaki… Isso mesmo disse Anne Brown, da
Arts Company, que publicou grande parte das suas fotografias:
«Ele sofreu muito, mas sempre evitava
falar disso porque sentia que a dor do japonês era mais importante
que o seu próprio sofrimento.»
Contratado pela Agência de Informação norte-americana
pouco depois da Segunda Guerra Mundial, Joe O’Donnell tornou-se o
fotógrafo oficial da Casa Branca nas presidências de Roosevelt,
Truman, Eisenhower, Kennedy e Johnson! O seu talento era notável,
mas alguém esperava que um repórter de guerra pudesse fazer um
‘Jackie Kennedy frontal view’ (closeup) como num retrato de
Warhol a PB?
Na verdade, O’Donnell é o autor de célebres
reportagens, como a Conferência de Tehran com Estaline, Churchill e
Roosevelt e os encontros de Kruschev com Eisenhower, Churchill com
Nixon, Kruschev com Nixon… Mas, do mesmo modo que registou com a sua
câmara as guerras na Coreia e no Japão, acabou por testemunhar a
própria tragédia que se abateu sobre a América com o assassinato do
jovem presidente Kennedy. São duas realidades distintas, é verdade,
mas O’Donnell fez o trabalho que lhe competia: realizou em
Washington o famoso «John John salute» decerto com o mesmo
sentido de responsabilidade com que fotografou em Nagasaki a criança
que carregava às costas o cadáver do seu irmão para o crematório. E
curiosamente, tal como Eugene Smith, casou-se com uma japonesa, a
também fotógrafa Kimiko Sakai…
Morreu num hospital de Nashville, no dia 10 de
Agosto, com 85 anos de idade. Decerto, com o sentido do dever
cumprido.

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