manual de sobrevivência
[ III ]
«O genocídio é sempre um empreendimento
colectivo.»
OMER
BARTOV

foto JORGE HENRIQUES (Porto, cerca de 1950)
morreu o periquito verde
as crianças vieram mais cedo da
escola
já
só tenho um cantinho do meu jardim de
margaridas.
_______
No dia em que os tecnocratas da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu e
do Fundo Monetário Internacional ameaçaram baixar mais uma vez os salários
dos trabalhadores do Estado: depois de vender os
anéis é preciso desfazer-se dos dedos e arrastar, por fim, os ossos
para uma "sala de fumo" de Treblinka.
Carregando setenta anos de civilização, a UE está hoje
a fazer aos funcionários públicos o mesmo que os nazis fizeram aos
judeus em 1943.
Quando o meu país conseguir reerguer-se da decadência a que nos leva
a indiferença colectiva, haverá muitos homens vulgares (nas palavras
de Christopher Browning) — ou seja: os beneficiários do mal (segundo Götz Aly) —, a terem que dedicar-se
a reescrever a história ou a esse
outro exercício vergonhoso a que se refere Bartov: o apagamento da memória.
«Serrei a macieira ao
pé da janela»
— diz Olav H. Hauge. «Por um
lado, tapava a vista, a sala de estar
ficava pálida no Verão, por outro lado,
os grossistas já não queriam aquela
qualidade de maçã. Pensei no que diria
meu pai, ele gostava daquela macieira.
Ainda assim, serrei-a. (...) Dói sempre
que olho o cepo: quando enfraquecer,
irei desfazê-lo em lenha.»
Pois, também aos 30 milhões de
desempregados e aos reformados vítimas dos
«grossistas»
da União Europeia a vida deveria
permitir alimentar «um gato sensível»
(ainda Olav H. Hauge), encomendar lenha
seca ou mesmo
[
antes de morrer
] cultivar «um
pedaço de terra».
"Olav H. Hauge"
Olav Håkonson Hauge (1908-1994),
Noruega. «Serrei a macieira ao pé da
janela», numa tradução de Henrique
Manuel Bento Fialho.
Relacionado [
a hipótese Estado
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