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Lisboa — saudade e claustrofobia
{ José Rodrigues Miguéis }
Vem aí Dezembro.
Correm 109 anos sobre o
nascimento de JRM.

José Rodrigues Miguéis em
Fevereiro de 1958.
fotografia do espólio da Brown University Library,
E.U.A.
Diz Vergílio Ferreira que a arte tem uma função
catártica, purifica o íntimo, alivia e liberta das obsessões:
«Possivelmente a arte tem sido para mim a grande catarse (...). Antes de escrever
'Manhã Submersa' sonhava muito com o seminário, com o desejo e impossibilidade de sair dele. Nunca mais sonhei.»
(Vergílio Ferreira, 'Conta-Corrente I', 3ª edição, 1982).
Lembrando como na minha adolescência — a minha infância literária — a obra do autor de 'Léah e Outras Histórias' contribuiu em muito para apaziguar
esse «feixe de
odores» de Chadourne,
creio que o próprio Rodrigues Miguéis assim se revê, numa
certa idade (a infância) e num determinado lugar (Lisboa),
dupla e irremediavelmente dividido:
1 — entre a realidade e a ficção («Até que ponto pode um escritor falar das suas experiências pessoais sem incorrer na pecha de subjectivismo e sem ser indiscreto a respeito de si próprio?»,
em 'Um Homem Sorri à Morte — Com Meia Cara', 2ª edição, Lisboa, Estúdios Cor, 1965);
2 — entre Alfama e Manhattan, porque, na diáspora e especialmente
depois da passagem por uma experiência que quase o levou à morte, o
escritor renasce «sensível e subjectivado» (em «lancinante nostalgia», segundo Eduardo Lourenço),
vacilando entre a saudade da mítica Lisboa antiga, vista
de longe, e a claustrofobia da Lisboa contemporânea, quando vista de
perto.
Parece ameaça (ou profecia): José Rodrigues Miguéis
nasceu na Rua da Saudade — número 13, dizem uns, outros dizem que
foi no número 12 — no bairro típico de Alfama, 9 de Dezembro de 1901.
Segue-se o reconto biográfico.
Filho de Manuel Maria Miguéis Pombo
(um galego natural de Santiago de Borbén, da actual freguesia de Pazos, Pontevedra) e Maria Adelaide Rodrigues Miguéis (de Góis,
Coimbra), concluiu os seus estudos secundários no Liceu Camões em
1917. Colaborou desde muito cedo em diversos
jornais e revistas e em 1922 integrou o grupo da Seara Nova,
com Jaime Cortesão, António Sérgio, José Gomes Ferreira, Irene
Lisboa... e depois Mário Dionísio e Jorge de Sena, entre muitos
outros. Formou-se em Direito
em 1924, mas praticamente não exerceu. Activista dos ideais
republicanos (primeira desilusão, revelada mais tarde),
presidiu à União da Mocidade Republicana. Interessou-se pelo Ensino e,
bolseiro da Junta de Educação Nacional,
em 1929 rumou à Bélgica, para uma
pós-graduação em Ciências Pedagógicas pela Universidade Livre de
Bruxelas, concluída em 1933. Regressado a Portugal, neste mesmo
ano fundou e dirigiu, com Bento de Jesus Caraça, o semanário Globo
(imediatamente apreendido — segunda desilusão). Entretanto, porque o seu
estilo dostoievskiano, de compromisso com o realismo ético, não interessava ao Estado Novo,
e porque o incomodavam muito
as privações do regime e ainda — decerto — porque não esquecera um amor antigo (Camila Pitta Campanella era luso-descendente
e passou por Lisboa em 1928), em 1935
partiu para os Estados Unidos. Adquiriu a nacionalidade
norte-americana, em 1942, depois de participar em diversas acções
políticas contra a ditadura portuguesa e a favor dos Republicanos na
guerra civil espanhola. Escreveu muito, conferenciou em diversas
universidades e empregou-se como
tradutor e redactor das Selecções do Reader's Digest para
ganhar a vida. Durante
muito tempo insistiu ainda por
diversas vezes em revisitar Portugal, sempre sob a estreita
vigilância da polícia política, e passou também episodicamente pelo Brasil.
Em 1979 foi agraciado pelo governo português com o grau de Grande
Oficial da Ordem Militar de Santiago da Espada, mas (desiludido, por uma última vez, com o rumo da
revolução) o 25 de Abril não
o fez regressar.
Faleceu em Nova Iorque a 27 de
Outubro de 1980, quando era já,
segundo a sua amiga Maria de Sousa, «um homem novo
cativo de um corpo velho; chega uma altura em que o corpo
velho já não aguenta mais o corpo novo, portanto acaba por ganhar o
corpo mortal...» (documentário biográfico de
Diana Andringa, RTP, 1998).
Vista de Manhattan, a Lisboa saudosa sobrevive, e é
essa magnífica obra [José Rodrigues Miguéis foi um dos maiores
escritores portugueses do século XX] que a outra Lisboa, a contemporânea e claustrofóbica
(ainda), praticamente esqueceu.
____
"uma experiência que quase o levou à morte"
Como no livro 'De Profundis Valsa Lenta'
(1997), de Cardoso Pires,
em 'Um Homem Sorri à Morte — Com Meia Cara' (publicado em 1959) relata-se
na primeira pessoa a
experiência da iminência da morte. No Outono de 1945
José Rodrigues Miguéis entra num hospital público de Nova Iorque com
uma infecção cerebral, que lhe causou paralisia facial do lado
esquerdo. Os anos que se seguiram foram de intensa
actividade criativa, com contos, romances e novelas, de que se
destacam «Saudades para a Dona Genciana» (1956), «Léah e Outras Histórias» (1958),
«A Escola do Paraíso» (1960), «Gente da Terceira Classe» (1962) e «Nikalai! Nikalai!» (1971).
"Parece ameaça (ou profecia): Rua da Saudade, número 13"
Isso que chamamos Nostalgia — dor-do-lar, saudade ou longing — é
apenas anseio de auto-identificação e permanência na infinidade do
espaço-tempo, esse mundo subjectivo cujo perpétuo movimento ou devir
nos ameaça a cada instante de alienação ou aniquilamento. Notas
do autor em 'Nikalai! Nikalai!', 1ª edição, 1971, p.198. Enfim, como
seria José Rodrigues Miguéis sem essa nostalgia, o seu longing,
as ameaças de alienação e aniquilamento?
"para ganhar a vida"
Hoje, por exemplo, sentei-me a esta mesa às 10 da manhã; lutei todo o
dia com salmões, toninhas e trutas da menagerie do R.D. [Reader's Digest].
(...) É assim quase todos os
dias, para aprontar aquelas duas a três páginas da revista, sem as quais
não há o clássico bacon & eggs! J.R.M. em carta ao seu biógrafo Mário
Neves ('José Rodrigues Miguéis: Vida e Obra', Caminho, Lisboa,
1990).
Numa entrevista concedida a Carolina Matos em 1980 ('José Rodrigues Miguéis: Lisboa em Manhattan', org. de Onésimo Teotónio
Almeida, Estampa, Lisboa, 2001), o escritor admite que a tradução foi a sua
fonte permanente de rendimento. Entre outras razões, terá sido
também por isso que ali mesmo confessou: «O homem em nós mata o
escritor».

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