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  Post 061 -  Outubro de 2011  

 

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Lembro-me deste homem e penso no que teria hoje a dizer da ameaça dos mercados. Brincando com Dostoiévski (Os Irmãos Karamazov), há uma pergunta maldita que certamente não deixaria de fazer: aonde está Deus, afinal, se tudo lhes é permitido?

 

 

amor e destroços

o céptico Bertrand Russell ou

um génio insuportável?

 

 

 

foto ALFRED EISENSTAEDT Time Life Pictures/Getty Images

 

 

 

«Um homem de génio é insuportável se não possuir, pelo menos, duas outras qualidades: gratidão e asseio.»

NIETZSCHE

 

 

1. A dúvida

Se Felicity Ann Russell tivesse de sentar-se ainda hoje em frente dos jornalistas, para falar sobre a vida privada do seu avô "Bertie", não seria difícil perceber na expressão amargurada desta mulher de 67 anos a trágica e pesada herança genealógica, centrada na figura de um dos mais célebres filósofos do século XX, Bertrand Russell, o matemático brilhante, Nobel da Literatura em 1950 «pelos seus ideais humanitários...», activista convicto contra a guerra no Vietname e também — com Einstein — contra as armas nucleares, considerado em todo o mundo (mesmo em 1970, quando morreu, com quase 98 anos de idade) uma voz inconformada e uma autoridade moral, até porque nas próprias palavras a sua longa vida foi orientada por três grandes paixões: «a procura do amor, a ânsia pelo conhecimento e uma compaixão insuportável pela Humanidade».

 

Entretanto, num documentário para a BBC (A Procura do Amor, BBC-Blakeway Productions, 1997), a neta Felicity refere: «Todas as famílias que constituiu e todas as relações com mulheres e filhos se desintegraram e, no geral, acabavam com a destruição das suas mentes, e então ele abandonava-as deixando os destroços...»

 

Terá sido Bertrand Russell um génio insuportável?

 

 

2. Tragédias e desconfiança

Não cabe aqui contar os trágicos pormenores da vida íntima do filósofo Bertrand Russell. Resume-se: afastou-se radicalmente das suas três primeiras mulheres (o falhanço do puritanismo e do amor livre), traiu o filho mais velho (a ameaça da loucura), provocou, mesmo à distância, o suicídio da neta mais nova, que lançou fogo sobre si mesma (o eterno conflito de gerações). A verdade é que toda a sua dialéctica filosófica foi caracterizada pela lógica do cepticismo: o descrédito em Deus (e em certa medida no homem) e a incessante procura do impossível (a paz, ou um qualquer estado de harmonia entre homem e Natureza), talvez porque falhou em quase tudo na sua vida privada: «Sem dúvida que a grandeza dele residia toda na sua vida pública» (Katherine, a filha).

 

O que resulta de tudo isto é essa inesperada convivência entre o amor e os destroços («O segredo da felicidade está em reconhecer o facto de que o mundo é horrível, horrível, horrível») e por fim uma estranha  solidão («Eu conheço a solidão, vagueio no mundo como um fantasma...»).

 

Não se deve acreditar num céptico (aliás, um céptico acreditará em si mesmo?). Então, o que se poderá dizer ainda em defesa do génio?

 

 

3. O método

Em 1975 a filha Katherine Tait refere: «Eu acredito que passou toda a sua longa vida à procura de Deus...» (o Deus que lhe faltou na infância?).

Em 1997, no documentário da BBC, o guionista Denys Blakeway afirma quase a mesma coisa por outras palavras: «A perda da fé em Deus abarca um profundo sentido de precariedade do ser humano, que conduz à interrogação filosófica.»

 

Em conclusão (se é que se pode chegar a alguma conclusão falando de Bertrand Russell), talvez seja impossível separar o génio do homem, o homem do amor e o amor dos destroços.

 

____

"o Deus que lhe faltou na infância?"

É impossível impor Nietzsche (mesmo circunstancialmente, como em «gratidão e asseio»), e referir ainda o descrédito em Deus, sem lembrar os dramáticos primeiros anos da existência de Bertrand Russell. Se é certo que falhou em quase tudo na sua vida privada, não é menos verdade que esta começou por ser-lhe ingrata e grosseira: aos dois anos perdeu a mãe e uma irmã, dezoito meses depois perdeu o pai e dois anos mais tarde o avô, e assim ficou submetido à austera educação vitoriana da sua avó até aos dezoito. Não terá isto contribuído também para «a perda da fé», «o mundo horrível» e, em suma, todo o seu destino filosófico?

 

"um homem de génio"

«A man with genius is unendurable if he does not possess at least two things in addition: gratitude and cleanliness.» Friedrich Nietzsche, Beyond Good and Evil, 1886.

 

"três grandes paixões"

«Three passions, simple but overwhelmingly strong, have governed my life: the longing for love, the search for knowledge, and unbearable pity for the suffering of mankind.» The Autobiography of Bertrand Russell, 3 vols., Londres, 1967-69.

 

"o segredo da felicidade"

«The secret to happiness is to face the fact that the world is horrible, horrible, horrible.» Referido por Alan Wood em Bertrand Russell, the Passionate Sceptic, Londres, 1957.

 

"eu conheço a solidão"

«I know the great loneliness, as I wander through the world like a ghost.» Bertrand Russell — Autobiography, 2 vols., Boston, 1968.

Ray Monk, que prefaciou o livro «My Father, Bertrand Russell» (Katherine Tait), corroborou esta ideia em Bertrand Russell: The Spirit of Solitude, Londres, 1996.

 

"à procura de Deus..."

«I believe myself that his whole life was a search for God...» Katherine Tait (Katherine Russell de baptismo) em My Father, Bertrand Russell, Nova Iorque, 1975.

 

 

 

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