POEMAS
SOBRE PAPEL VELHO
das séries Manual de Sobrevivência e Diário Íntimo

«Foram precisas todas as coisas/para que um dia as nossas mãos se unissem.» JLB, História da Noite, 1977.
Borges tinha razão: o que poderemos escrever hoje que não tenha sido escrito já há muito tempo? A melhor explicação para tudo isto é talvez porque continuamos a esforçar-nos para «salvar o mundo», como ele diz em A Cifra, 1981.
sob o candeeiro cilíndrico de imitação de seda púrpura
sussurro-te ao ouvido um poema do cego Borges
(o cego Jorge Luis Borges,
servo na Babilónia e invisível na Lua).
no camiseiro de mogno as fotografias
e aquele teu amuleto pequenino — o menino pobre
de joelhos
a rezar.
e as pétalas — labirínticos afectos nos bilhetinhos colados
na cabeceira da cama.
e as sombras, os espelhos, os filhos, os bichos
e as coisas (tantas coisas!).
aonde nos voltaremos todos a encontrar?
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